A maioria dos pacientes que possuem indicação de cirurgia de prótese de quadril, também conhecida como artroplastia total de quadril, apresentam uma grande dúvida:
Quanto tempo dura a prótese?
Vou precisar operar de novo?
Preciso trocá-la em 10 anos?
A prótese perfeita deveria durar para sempre e nunca precisar ser substituída, mas na prática muitos fatores interferem para que isto não aconteça.
Certamente, algumas dúvidas partem de desinformação ou até mesmo de conceitos equivocados.
Um número mágico e completamente sem fundamento para a durabilidade de uma prótese é de 10 anos.
Quem já ouviu falar que uma prótese dura 10 anos?
A partir de hoje, você nunca mais repetirá esta informação.
Neste artigo, não só desvendarei os mistérios sobre a durabilidade da prótese de quadril, mas vou explicar de maneira clara e fácil o porquê uma prótese, às vezes, precisa ser trocada.
Principais causas de troca de prótese
Para começar, é necessário saber porque uma nova cirurgia precisa ser indicada e como ela pode ser evitada.
Dentre todas as causas possíveis de indicação para se reoperar uma prótese, a chamada cirurgia de revisão, três principais indicações ganham destaque, em ordem crescente de importância:
- Deslocamento ou luxação da prótese
- Infecção, popularmente chamada de rejeição
- Soltura dos componentes ou soltura asséptica
Luxação de prótese
Por ser um encaixe entre dois componentes, quando o paciente realiza um movimento muito além do que o tolerado e indicado, a prótese pode se deslocar, sair do lugar.
A este deslocamento damos o nome de luxação.
Ela é um evento agudo, rápido e sempre seguido de dor intensa e que incapacidade para andar. O paciente deve ser levado para o hospital, e sob sedação, a prótese é colocada no lugar, sem a necessidade de cirurgia.
Em alguns casos, quando ocorre pode vários episódios de luxação, pode haver a necessidade de troca da prótese por componentes especiais, sendo esta também uma indicação para se reoperar um paciente.
A principal causa de luxação está ligada a fraqueza da musculatura ao redor da prótese.
Pacientes com sequela de doenças neurológicas como AVC ou com idade avançada são os que mais apresentam este tipo de complicação.
Uma forma de prevenção para pacientes com prótese é a realização de atividades de fortalecimento do quadril, com exercícios como academia, natação, hidroginástica, caminhadas, bicicleta.
Infecção ou rejeição
A infecção da prótese de quadril, é uma complicação temida e deve ser tratada com muito cuidado por um especialista na área. Ela apresenta alguns sintomas específicos.
Quando presente, a cirurgia deve ser indicada, a fim de realizar limpeza local e verificar a necessidade de trocar a prótese.
Soltura asséptica
A soltura dos componentes é a principal causa de revisão e está diretamente ligada a durabilidade da prótese.
Para entender como ocorre, iniciarei de princípios fundamentais, sobre a prótese e seus componentes.
Em primeiro lugar, uma prótese de quadril não funciona como um pneu de carro.
Isso mesmo.
A maioria das pessoas acham que a prótese de quadril desgasta e precisa ser trocada como se fosse o pneu de um carro, que já perdeu sua vida útil e ficou careca a ponto de quase furar.
Na maioria das vezes isso não chega a acontecer.
Apesar da prótese de quadril também apresentar uma superfície que pode sofrer com desgaste, semelhante a um pneu de carro, antes que ela se desgaste por completo, outro evento acontece, e ele é o principal responsável pela falha da prótese.
Durante a cirurgia de prótese de quadril ocorre a fixação dos componentes da prótese em duas partes ósseas: a cavidade da bacia, que recebe o nome de acetábulo, e o canal do fêmur, osso da coxa.
Estes dois componentes se movimentam entre si através do encaixe de uma bola fixada ao componente femoral que se move dentro do componente acetabular.
Por causa do movimento neste local, ocorre um atrito inevitável entre estes componentes e dependendo do material que a prótese foi feita, esse atrito pode ser maior ou menor.
Existe uma ciência que estuda a interação e o desgaste entre estas duas superfícies de contato que recebe o nome de Tribologia.
Ela é muito importante porque define quais materiais apresentam menores taxas de atrito e por consequência, maior durabilidade.
Por isso, a escolha do melhor material da prótese, de acordo com o perfil de cada paciente, pode interferir na vida útil da prótese.
Materiais da prótese
Os componentes da prótese apresentam as seguintes combinações de materiais:
- Metal-polietileno: A cabeça da prótese formada de liga metálica e o componente acetabular de polietileno, um plástico de alta resistência. É a superfície de contato mais antiga e evoluiu muito nos últimos tempos com a tecnologia de um tipo especial chamado cross-linked.
- Cerâmica-polietileno: A cabeça constituída por cerâmica e o componente acetabular de polietileno. Visa aumentar a durabilidade da prótese pois a cerâmica apresenta menor desgaste que o polietileno.
- Cerâmica-cerâmica: Tanto a cabeça quanto o componente acetabular feitos de cerâmica. Apresenta pouco desgaste, porém algumas particularidades como rangidos e fraturas.
- Metal-metal: Cabeça e acetábulo de metal. Com a promessa de pouco desgaste e retorno à atividade física de impacto, era indicada para indivíduos jovens. Porém, com alguns problemas como pseudotumor e intoxicação por liberação de metal no corpo, hoje está em desuso.
Cada uma destas superfícies causam um tipo de atrito que gera uma lesão no material e liberam uma quantidade de micropartículas.
Estas partículas que se soltam da prótese acabam se acumulando na região da cirurgia. Elas são reconhecidas pelo organismo como corpos estranhos e, na tentativa de retirá-las, as células produzem uma reação de defesa.
Porém, quando as células de defesa atacam estas partículas, elas sofrem reações que produz mais inflamação.
Este processo pode acontecer próximo ao tecido ósseo e interferir na qualidade do osso ao redor da prótese. Com o passar do tempo, este osso pode ser reabsorvido, tornando-se frágil. É aí que a prótese pode se soltar dele, ocasionando a principal indicação de cirurgia em pacientes com prótese.
Quando isto acontece, é necessário trocar a prótese.
Quanto mais partículas forem produzidas e mais reação inflamatória existir, menor durabilidade a prótese terá.
Sabendo desta informação, agora podemos responder quanto tempo dura uma prótese de quadril.
Registros de prótese
Em alguns países em excelência em saúde, existem os registros nacionais de prótese.
Todas as cirurgias realizadas nestes países, obrigatoriamente são registradas e acompanhadas. Através destes dados e estatísticas podemos comparar os vários tipos de próteses e seus vários modelos.
Dados do registro nacional britânico de próteses
Os registros mais importante e de maior confiabilidade são da Suécia, Noruega, Inglaterra e Nova Zelândia.
Todos os anos, eles emitem um boletim com os dados e estes são de livre acesso para cirurgiões, empresas e pacientes.
O registro britânico apresenta gráficos e tabelas de fácil compreensão.
Clique aqui para acessar o relatório de 2018.
Quanto tempo dura uma prótese de quadril?
Alguns órgãos internacionais, como o National Institute for Health and Care Excellence, após anos de pesquisa e estudos, recomendam que o implante de quadril tenha uma durabilidade em 10 anos de no mínimo 95%.
Isto significa que se pegarmos 100 pessoas operadas de quadril e acompanharmos por 10 anos, pelo menos 95 ainda deverão estar com a mesma prótese.
Portanto não é correto afirmar que uma prótese de quadril dura 10 anos.
E é essa a parte interessante e com embasamento científico deste processo.
Se olharmos dentro dos registros nacionais, veremos quantos e quais são os implantes que tem durabilidade acima de 95% em 10 anos.
Com quase um milhão de próteses em acompanhamento, o registro de próteses da Inglaterra relata que, dependendo dos componentes, técnicas de colocação, sexo e idade do paciente, a chance de troca pode chegar a quase 2% em 14 anos.
Além disso, pacientes abaixo de 50 anos exigem mais do implante e apresentam maior chance de falha, bem como o sexo masculino.
A prótese com componentes de metal-metal, que no passado recente parecia ser a solução para homens jovens, apresentou índices de revisão em 14.76% e atualmente não é mais indicada.
Com materiais de implante mais resistentes e com melhor deslizamento, a longevidade da prótese de quadril está cada vez maior.
Materiais como polietileno cross-linked e superfícies de cerâmica contribuíram muito para esta realidade.
O bom desempenho das próteses possibilitou ainda a utilização de cabeças cada vez maiores, o que diminuiu ainda mais a chance de luxação como complicação do procedimento.
Outra evolução está nas técnicas de fixação da prótese ao osso.
Seja através de colocação de cimento ósseo com técnicas aprimoradas ou do revestimento dos componentes com materiais tecnológicos, a fixação da prótese ocorre no momento da cirurgia, sendo que no dia seguinte da operação o paciente é liberado para andar com apoio e sair da cama.
Através de cirurgias com menor corte na pele e menor lesão muscular, hoje a cirurgia se tornou mais rápida, com menor complicações e com reabilitação precoce.
Para um bom desempenho da prótese, além da escolha do material correto, é necessário a utilização da técnica operatória adequada e dos cuidados do paciente após o procedimento.
Escolher um especialista e confiar em sua conduta, pode ser a parte mais importante de todo este processo.
É ele que irá discutir o melhor implante a melhor técnica cirúrgica para cada caso e provavelmente acompanhará a evolução do paciente pelo resto da vida.